
A História por trás de Os Bons Companheiros!
5 min.
03/09/2020
Guilherme Salomão
Os Bons Companheiros (1990) completa, em 2020, 30 anos de seu lançamento. O longa, do gigante Martin Scorsese, se tornou um clássico do cinema, sendo considerado um dos melhores filmes de máfia da história. Alguns estudiosos da sétima arte, por exemplo, o consideram o melhor do gênero depois de O Poderoso Chefão (1972), de Francis Ford Coppola.
Na época que Scorsese realizou o longa, ele já era um dos principais diretores no cenário global do cinema. Ele vinha de duas frutíferas décadas, onde realizou sucessos como Taxi Driver (1976), Touro Indomável (1980), O Rei da Comédia (1982) e o polêmico A última Tentação de Cristo (1988). Além disso, lidar com o assunto máfia não era uma novidade e tanto para o cineasta. Em 1973, ele lançou Caminhos Perigosos, filme que tratava do assunto e que marcou sua primeira parceria com o ator Robert De Niro.

O diretor também não era familiarizado com o assunto somente por conta de já ter realizado um filme sobre ele. Scorsese, um ítalo-americano, cresceu em um ambiente cercado de mafiosos em seu país natal, a Itália. Dessa forma, a história do diretor com o filme começa com o seu interesse no livro Wiseguy, de Nicholas Pillegi. O romance, que é baseado em uma história real, conta a ascensão e queda de três mafiosos e chamou a atenção de Scorsese por seu retratamento realista e pés no chão da figura dos gangsteres. Esse era justamente o retrato que Scorsese vivenciou, diferente daquele extremamente glamourizado que filmes como o próprio O Poderoso Chefão apresentam.
Unindo forças com Pillegi, o cineasta e o autor trabalharam juntos no roteiro de Os Bons Companheiros. Scorsese queria nos mostrar uma outra máfia. Uma "de bairro", menos "grandiosa”, e, justamente, mais próxima daquilo que ele presenciou em sua juventude na Itália. A intenção do diretor era nos deixar próximos dos protagonistas e entender suas motivações ao se tornarem mafiosos. Eles são pessoas mais comuns, em busca de respeito e prestígio, e o tempo todo estamos acompanhando de perto suas vidas- suas conversas, os eventos que frequentam, momentos em família, etc. Aqui, saem de cena o glamour e formalidades dos Corleone, por exemplo, para dar lugar a ambientes e acontecimentos mais "grosseiros", por assim dizer.
A escolha do elenco foi um acerto e um dos trunfos do filme. Ray Liotta interpreta o protagonista Henry, um garoto que sempre sonhou em ser um mafioso, desde cedo se envolvendo com a máfia local que controlava a região onde ele morava. Ao se juntar "oficialmente" a eles, se torna próximo de Jimmy, interpretado por Robert DeNiro (parceiro de longa data de Scorsese) e Tommy, vivido pelo sensacional Joe Pesci, que saiu vitorioso no Oscar de 1991 na categoria Melhor Ator Coadjuvante por seu papel no longa.

Porém, dentro de todos esses pontos, não podemos esquecer daquele que é talvez o principal em trazer esse sentimento: a narração em primeira pessoa pelo protagonista. Ao longo de todo o filme, a ascensão e queda de Henry e seus companheiros é narrada por ele mesmo, como se ele estivesse nos contando diretamente os acontecimentos. Logo na sequência de abertura (após um pequeno prólogo), uma das melhores da história do cinema, ele nos conta que "Desde que eu me lembro, eu sempre quis ser um gangster". A partir daqui começamos explorar a jornada de nosso protagonista. Entendemos quem ele é; quais são as suas origens; o que ele enxerga de tão incrível na máfia; suas amizades; a decepção e traição as pessoas próximas, e, por fim, o seu declínio, que leva embora junto nossa proximidade (e até uma certa apreciação) aos personagens ao longo desse processo.

Assim, o resultado final de Os Bons Companheiros foi o objetivo de Scorsese, de elaborar um retrato diferente de todos que já haviam sido apresentados da figura do gângsters no cinema até então, sendo cumprido. É claro que a busca por dinheiro e respeito, por exemplo, são algo em comum entre algumas dessas adaptações pregressas e o filme. Porém, como dito ao longo desse texto, o ponto central está em quem são e como são retratadas essas pessoas.
Com esse filme, portanto, Martin Scorsese provou mais uma vez o porque de ser um dos maiores diretores da história. Status que hoje, 30 anos depois, o cineasta, com seus 77 anos, não perdeu. Pelo contrário, só o provou mais ainda, levando a ser considerado por muitos como o maior diretor vivo. Depois de Os Bons Companheiros, ele lançou obras também aclamadas, como Casino (1995), Os Infiltrados (2006), O Lobo de Wall Street (2013) e, mais recentemente, O Irlandês (2019).
E aí, já pensou em começar a apreciar a obra desse mestre da sétima arte se você ainda não a conhece? Fica a dica!